quinta-feira, 10 de março de 2016

86) O GUIA (ótima história)


14 - O GUIA (ótima história)


       Necessitando melhorar conhecimentos de orientação, acompanhei um dia de serviço do guardião Aurelino Piva, Espírito amigo que desempenha a função de guia comum da senhora Sinésia Camerino, dama culta e distinta, domiciliada em elegante setor do mundo paulista.
       Cabia-me aprender como ajudar alguém, individualmente, na posição de desencarnado.
       Auxiliar em esforço anônimo, exercer o amor silencioso e desconhecido.
       Cheguei cedo à residência, cujo pequeno jardim a primavera aformoseada.       
      Quatro horas da manhã, justamente quando Aurelino preparava as forças de sua protegida para o dia nascente. Trabalho de humildade e devotamento.

       Na véspera, dona Sinésia não estivera tão sóbria ao jantar. Excedera-se em quitutes e licores, mas o amigo espiritual erguia-se em piedosa sentinela e, antes que a senhora reabrisse os olhos no corpo, aplicava-lhe passes de reajuste.
       - É preciso que nossa irmã desperte tão hígida quanto possível – explicou-me.
       E sorrindo:
       - Um dia tranqüilo no corpo físico é uma bênção que devemos enriquecer de harmonia e esperança.
       Depois de complicada operação magnética, observei que a tutelada se dispunha a movimentar-se, e esperei.


       Seis horas da manhã.
       Aurelino formulou uma prece, rogando ao Senhor lhe abençoasse a nova oportunidade de trabalho e tive a idéia de tornar a escutar-lhe as palavras confortadoras: “um dia tranqüilo no corpo físico é uma bênção...”
       A senhora acordou e o benfeitor espiritual postou-se ao lado dela, à feição de pai amoroso, falando-lhe dos recursos imensos da vida que estuavam lá fora, como a buscar-lhe o coração para o serviço com alegria. Dona Sinésia ouvia em pensamento e, qual se dialogasse consigo mesma, recusava a mensagem de otimismo e respondeu às benéficas sugestões, resmungando: 
       - “dia aborrecido, tempo sem graça...” 
       Nisso, dois meninos altercaram, lá dentro, com a empregada. Bate-boca em família. Dona Sinésia não se mexeu. Sabia que os dois filhos manhosos nada queriam com estudo, nem suportavam qualquer disciplina, mas não deu bola.      
       Aurelino, porém, correu à copa e eu o acompanhei.
       O amigo desencarnado apaziguou as crianças e acalmou a servidora da casa, à custa de       apelos edificantes. Ajudou os pequenos a encontrarem os cadernos de exercícios escolares que haviam perdido e acompanhou-os até o ônibus. 
       De volta ao interior doméstico, chegou a vez de se amparar o esposo de Dona Sinésia, que deixara o quarto sob grande acesso de tosse. Bronquite velha. 
       Um guardião espiritual, ligado a ele, auxiliava-o, presto; no entanto, Aureliano pensou na tranqüilidade de sua protegida e entregou-se à tarefa de colaboração socorrista. Passes, insuflações.
       O chefe da família estava nervoso, abatido. Aurelino não repousou enquanto não lhe viu o espírito asserenado, diante da empregada, a quem auxiliou de novo, a fim de que o café com leite fôsse servido com carinho e limpeza. 

       Logo após, demandou o grande aposento, em que iniciáramos a tarefa, rogando a Dona Sinésia viesse à copa abençoar o marido com um sorriso de confiança. A dama escutou o convite suplicante, através da intuição, mas ficou absolutamente parada sob os lençóis, e, ouvindo o esposo a pigarrear, na
saída, comentou intimamente: “não vou com asma, estou farta”.
       Sete horas. Aurelino estugou o passe a fim de sustentar o senhor Camerino, na travessia da rua. Explicou-me que Dona Sinésia precisava de paz e, em razão disso, devia ajudar-lhe o marido com as melhores possibilidades de que dispunha. E, atencioso, deu a ele, na espera da condução, idéias de tolerância e caridade, bom ânimo e fé viva para compreender as suas dificuldades de contador na firma a que se vincula.

       Regressamos a casa. Dona Sinésia em descanso. Oito horas, quando se levantou.
       Aurelino sugeriu-lhe o desejo de tomar água pura e informou-me de que se esmerava em defendê-la contra intoxicações. Magnetizou o líquido simples, dotando-o de qualidades terapêuticas especiais e... continuaram serviços e preocupações.
       Trabalho de proteção para Dona Sinésia, em múltiplas circunstâncias pequeninas suscetíveis de gerar grandes males; 
       apoio à empregada de Dona Sinésia, para que não falhassem minudências na harmonia do lar; 
       remoção de obstáculos a fim de que contratempos não viessem perturbar a calma de Dona Sinésia; 
       socorro incessante às crianças de Dona Sinésia, ao retornarem da escola; 

       cooperação indireta para que Dona Sinésia escolhesse os pratos capazes de lhe assegurarem a necessária euforia orgânica;
       inspirações adequadas de modo a que Dona Sinésia encontrasse boas leituras; 
       amparo constante ao senhor Camerino, tanto quanto possível, a fim de que Dona Sinésia não se afligisse...

       Enfim, Dona Sinésia, sem a obrigação de ser agradecida, já que não identificava os benefícios contínuos que recebia, teve um dia admirável, enquanto Aurelino e eu estávamos realmente estafados, não obstante a nossa condição de Espíritos sem corpo físico.
       À noite, porém, justamente quando Aurelino se sentou ao meu lado para dois dedos de prosa, Dona Sinésia, desatenta, feriu o polegar da mão esquerda com a agulha que manejava para enfeitar um vestido.

       Bastou isso e a senhora desmandou-se aos gritos:
       - Oh! meu Deus! meu Deus!... ninguém me ajuda! Vivo sozinha, desamparada!... Não há mulher mais infeliz do que eu!...
       Positivamente assombrado, espiei Aurelino, que se mantinha imperturbável, e observei: 
       - Que reação é esta, meu amigo? Dona Sinésia recolheu socorro e bênçãos durante o dia inteiro!... como justificar este ataque de cólera por picadela sem importância nenhuma?!...
       Aurelino, entretanto, sorriu e falou paciente:
       - Acalme-se, meu caro. Auxiliemos nossa irmã a reequilibrar-se. Esta irritação não há de ser nada. 

       Ela também, mais tarde, vai desencarnar como nós,...
       ... e será guia...

O GUIA - do livro Estante Da Vida - cap 14 - ditado pelo IRMÃO X - psicografia Francisco Cândido Xavier

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